sábado, 17 de julho de 2010

Bordados, tecidos, linhas e o tempo.

    Separei algumas caixas, abri com cuidado e resgatei do passado planos abandonados, coisas que me encantaram e por algum motivo precisaram ser guardadas, revirando tecidos, agulhas, aviamentos e linhas descobri mais do que esperava. Engraçado como alguns objetos conversam com o dono, relembram conversas, aquelas que temos com quem não pode verbalizar uma resposta esperando que a pronúncia seja interna.
    Me deparei com um tecido de etamine, já embanhado, com boa parte do bordado  adiantada, dobrado dentro de um saco plástico, as meadas de linha também estavam juntas e uma agulha sem ponta própria para bordar já enferrujada pelo tempo, observando os materiais tentei imaginar quais motivos me levaram a abandonar um trabalho quase pronto.  Foram necessários alguns minutos para relembrar a época em que foi começado, foram dez anos de repouso dentro do saco plástico até o reencontro.
    Segurei o tecido, deslizei os dedos pelas linhas já incorporadas na trama, o toque me remeteu ao passado, agora sabia o motivo de estar ali, frente ao companheiro de longas noites de insônia...Quando não se sabe o caminho para resolver alguns problemas uma forma de descobri-los é ausentar-se, pesquisar as causas e pensar.
     Cada ponto traçado naquele tecido amarelado pelo tempo tinha um sentido, e hoje desperto após anos de sobrevivência me serve de abrigo, retorno ao ir e vir de linhas, tento novamente resgatar algo que cabe somente a mim.
    Terminei o bordado, foram dez anos esperando para fechar um ciclo, iniciarei outros, espero conseguir terminá-los em menor tempo.
    Organizar minhas caixas,  me organizar por dentro, ficar com o que é realmente necessário, ter coragem para me disfazer do que não cabe mais apesar do apêgo, concluir o que foi começado, escolher com racionalidade o que será feito para não buscar o que não posso ter.  Bordar, mergulhar no meu avesso e ver o que escondo até de mim, lembrando que os pontos devem ser firmes, contados, precisos e que ao terminar uma peça pode-se começar outra.
    Descobri porque os guardei por tanto tempo, antes não era necessário abrir aquelas caixas para  trazer-me de volta.

Nenhum comentário: