domingo, 26 de setembro de 2010

Pétalas

Galhos torcidos balançam ao vento
dançam, se tocam, entrelaçam.
Noites e dias passam, é o tempo.
Deixam a mostra suas folhas
e até mesmo os espinhos.
Botões acenam singelos
espalham-se, seguem a luz.
Eis que chega a hora de desabrochar,
tanto encantamento, cores, odores.
Gotas de orvalho refrescam, evaporam.
Há tanta beleza,cativa,
agregam olhares, desejos e buscas.
Não basta apreciar...
Cortam-lhe a vida,
Guardam belos e mortos botões.
E pétalas sem vida caem aos poucos.
Algumas acabam presas em livros,
guardando o segredo dos momentos.
Outras voltam para terra,
esperando renascer.
Pétalas que forram os pés
de tantas musas, amadas.
Cobrem a dor da despedida,
ritualizam o amor.
Deixam de ser vida, para dizerem caladas o que as palavras não falam mais.

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Colcha de retalhos

Já tentou imaginar quanto tempo se leva para costurar uma colcha de retalhos, como são escolhidos cada quadradinho, a organização do tempo, a dedicação, e no final o que todos veem é se ela é quentinha ou não.
Aprendi a observar o processo das coisas, olhar de professora de Ed. Infantil, que se encanta com avanços cotidianos, percebe no comportamento o progresso do outro.
Não tive disciplina para fazer uma colcha de retalhos, parei no começo e me arrependo, podia ter enfrentado minha ansiedade e ter ampliado a paciência. Mas aprendi que o processo das coisas, da vida, conta muito mais do que o resultado final, são nas pequenas ações espontâneas que moram os mais nobres sentimentos.
Cada quadradinho da colcha deve ter uma história para contar, um caminho percorrido, mas o fato de serem costurados uns aos outros os transformam em algo maior, viram grupo, comunicam-se nas cores e estampas.
Sinto-me como um retalho já costurado numa colcha inacabada, faltam tantos quadradinhos para terminar e fico só aguardando alguém com paciência para costurar-me aos outros tecidos e suas histórias.
Entre os retalhos não existem padrões, são apenas parte de um todo.
Uma colcha de retalhos é também o encontro dos refugados, tiras que sobraram, mas que juntas constroem padrões estéticos embuídos de sentimentos e escolhas.
Engraçada esta vida, num dia se é o retalho esquecido, no outro a manta que aquece...
E talves por isto me reste esperança de tirar do nada o tudo que tanto busco. talvez um dia costure uma colcha de retalhos e posso me transpor figurativamente de objeto para criador, ou só me sinta confortada por ter conseguido ir até o final, fazer o melhor possível.
Preciso deitar meu rosto no travesseiro fofinho e esquecer das coisas inacabadas, focar no processo e dormir em paz, me falta uma colcha quentinha cheia de histórias para confortar o presente, sinto o tecido desfiado da vida e dói remendar cada pedacinho.

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Verdade

Primeira verdade na minha vida, minha mãe me ama.
Segunda verdade, minha filha me ama.
Terceira verdade, eu me amo.

O resto são como barquinhos de papel, lindo no começo, pode até flutuar por um tempo, mas afundam. Barquinhos de papel não trazem assinaturas, são frágeis e inseguros, servem para distrair, depois se perdem no tempo e viram apenas lembranças.

A verdade sempre aparece, seja no acaso, por um pressentimento, ou mesmo através dos olhos e reações que contam mais do que a covardia que cala.

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Percepção do tempo

Engraçado como o tempo passa e continuamos a acreditar na eternidade dos momentos, e num belo dia basta olhar no espelho e ver que o tempo passou, aparecem marcas no rosto, cabelos brancos e a forma de ver o mundo muda. Descobre-se derrepente que dá para envelhecer dez anos num dia.
Ainda bem, imagino a vida se ficassemos esperando as mudanças que o tempo traz, não seria fácil viver.
O corpo muda, e com sorte ganha-se alguma sabedoria.
Percebi meu tempo passando, rápido, implacável e a sede que tinha já não me cabe mais, como as roupas e cabelos que perdem o corte.

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Relacionar-se

Como é complicado conviver, isso não é nenhuma novidade porém não consigo encontrar ninguém que saiba fazer isso sem sair arranhado pela presença do outro ou sem arranhar quem o cerca.
Existem tantas regras de convivência e tantas maneiras de esquecê-las na correria do cotidiano...Cada um discursa suas justificativas para atropelar quem de alguma forma atrapalha seus planos.
Num trânsito de buscas abandonamos princípios, sentimentos e vestimos o traje do carrasco, é só percebemos quando alguém grita reclamando por seus direitos invadidos pelos nossos desejos.
Nessa história toda não importa o que o outro vai sentir ou enfrentar, cada um mede seus problemas e se acha no direito de ferir para se defender...
Todos temos habilidades  e dificuldades, escondemos e mostramos, mas algumas vezes não existe controle, ações explodem sem avisos.
Descobri a minha maior dificuldade...conviver! Sou inábil, desajeitada, despejo palavras, não disfarço meu sentir, fica estampado no meu rosto, reajo na hora e muitas vezes sem pensar. Isso me faz magoar, ferir quem não merece e confiar em quem não deveria.
Querer muito leva a assumir responsabilidades, arriscar-se.
É tão simples discursar sobre o assunto, complicado é fazer, conviver dói.

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Leitura pra viajar

Alguns livros marcaram minha vida, foram companheiros em aventuras muito particulares com direito a transgressão e fantasia, mas reler um livro depois de anos e se encantar com a descoberta de minúcias que a adolescência não me permitiu ver não tem preço...

“Sobretudo um dia virá em que todo meu movimento será criação, nascimento, eu romperei todos os nãos que existem dentro de mim, provarei a mim mesma que nada há a temer, que tudo o que eu for será sempre onde haja uma mulher com meu princípio, erguerei dentro de mim o que sou um dia, a um gesto meu minhas vagas se levantarão poderosas, água pura submergindo a dúvida, a consciência, eu serei forte como a alma de um animal e quando eu falar serão palavras não pensadas e lentas, não levemente sentidas, não cheias de vontade de humanidade, não o passado corroendo o futuro! O que eu disser soará fatal e inteiro!”
...
"E foi tão corpo que foi puro espírito. Atravessava os acontecimentos e as horas imaterial, esgueirando-se entre eles com a leveza de um instante."

PERTO DO CORAÇÃO SELVAGEM
Clarisse Lispector



domingo, 5 de setembro de 2010

Desencantamento

Queria ser tomada, dominada por uma força maior que me fizesse cair de joelhos, desafiar o destino, fazer algo impensável, gritar no meio da praça as verdades que ninguém deseja ouvir, ser Clarisse Lispector com a caneta na mão. Que angústia esta falta do que pensar, não existe novidade, tudo se repete numa constância de não existir.
Minhas leituras me transportam por segundos, mas meus olhos não conseguem manter o fascínio na realidade, parece que o mundo ficou desbotado, passaram borracha nas linhas, ficaram borrões e sombras.
Sou uma insatisfeita, que saco, seria qualidade não fosse meu hábito de deixar as pessoas coladas ao momento vivido, algumas congeladas no passado outras meio mortas no presente, vejo mas não me encanto.
Vou ser bruxa, fazer poções mágicas pra me encantar, ficar apaixonada pela vida por prazos inderteminados... E talvez só assim passe o marasmo, não espero grandes surpresas, os fatos já mostram que o terreno não é sólido.


Preferências

E bastava dizer que os mundos não se encontrariam, que as mentes não se sintonizam, mas tudo é dito de forma sutil e fica quase impossível ler diante de tanto receio de se mostrar, quem sabe o que habita atrás daquelas palavras tortas.
Cada olhar que escapava deixava um cheiro de jasmim no ar, tão leve que confundia dava esperança, seria medo ou incapacidade de sentir, e no jogo de gato e rato chegava a hora de abater a presa.
As preferências dela já esquecidas, guardadas nas gavetas longe dos olhos e da poeira que cobria sua alma tão cansada de desiludir-se, restavam fatos coisas que seus olhos fotografavam, imagens que se repetiam nos sonhos cada dia mais raros.
Num despertar repentino olhou-se, viu que restava encanto, que seu corpo  abrigava calor, que seu caminhar ainda era uma dança, que a platéia  estava lá, era só a poeira do seu não fazer que a impediu de ver os que a olhavam, foi preciso alguém gritar, rubrar seu rosto para que se descobrisse flor recém desabrochada, explendida, desejada.
Esquecera as palavras mornas, ouvia o arder da platéia, mas não queria ser diva  bastava ser humana, entretanto carecia daquele calor, fazia frio há tanto tempo...
Seu cansaso com a espera, foi substituído por um desejo alucinado de ser  livre, Frida khalo com pincéis na mão, muitas Marias com poeira nos pés, e nada do que fosse dito poderia fazê-la retroceder. As palavras não eram mais sua busca, cansara-se de esperá-las.
Não haveriam naves para resgatá-la, nem cavaleiros empunhando espadas, seriam passos na estrada, caminho definido, mesmo com frio na barriga ela não olharia para trás, estava convencida e demorou tanto que seria um pecado retroceder.
Nas suas fases de Lua encontrava-se nova, alguns poderiam vê-la durante o dia brilhando, outros notariam sua ausência durante a noite, mas ela sabia que o momento é de seguir para a fase crescente, ir aos poucos mas sem paradas, as preferências agoram eram só suas.